Felipe de Carolis é um ator versátil e multifacetado. Carioca de 35 anos, ele é daqueles que se entregam de corpo e alma a cada papel que assume. Assim foi com o Sam de “Verdades Secretas” e, agora, assim é com o “Sylvain Murdoch”, seu personagem na peça “Sedes”. Hoje, ele também é o convidado para estar na capa da Danz. Em nossa conversa, o artista falou sobre o trabalho, sobre o futuro e sobre a alegria que está sentindo por atuar em três vertentes no mesmo projeto.
Em cartaz no teatro Gláucio Gil, em Copacabana, no Rio de Janeiro, a peça “Sedes” é um grande debate sobre problemas muito atuais, críticas à sociedade e causa diversas reflexões. A recepção da história tem sido boa e, para Felipe, interpretar Sylvain é uma verdadeira honra. Mas para quem ainda não conferiu o espetáculo, vale lembrar que a última sessão da temporada está marcada para o próximo dia 28, segunda-feira.
“A história é bem poética, mas igualmente trágica. Não quero dar muitos spoilers, o público precisa assistir para entender!”, garantiu.
Além de atuar, ele também é responsável pela idealização e direção de produção, que são funções nada similares, mas que se completam nas mãos de um profissional como Carolis. Em meio à empolgação de todo o sucesso que “Sedes” tem feito, ele também compartilhou seus planos para o futuro: o lançamento de dois filmes e um projeto na França.
Motivos para comemorar, não faltam.
Sucesso para continuar, também não.
Com vocês, Felipe de Carolis.
Aqui, na Danz.
1. Como está sendo interpretar esse papel?
Honestamente, posso dizer que sou o homem mais feliz do mundo quando o teatro fica no breu. E olha que eu tenho a responsabilidade de abrir uma tragédia musical contemporânea à capela, cantando uma das partituras mais difíceis que já li e, ao final dela, partir para um solilóquio de 15 minutos que provoca uma provável perturbação na plateia.
Deixando a modéstia de lado e assumindo que eu só sou capaz de fazer isso hoje por causa do tempo e da experiência de carreira, digo que sou feliz pelo que estou realizando. Há 5 anos, acho que eu não seria capaz. Esse é o sentimento individual, mas isso não é um grão de areia perto do que é a potência deste texto, deste autor e do legado de Aderbal [diretor das primeiras obras da trilogia] para o Rio de Janeiro. O Rio de Janeiro precisava assistir essa peça. Precisa, na verdade. Se um dia eu tiver de sair, por algum motivo, a peça não pode parar. O texto é urgente, potente, dramático e ao mesmo tempo tem uma pegada bem-humorada. A história do espetáculo é uma oportunidade de alertar para o aumento dos diagnósticos de depressão, ansiedade e dos casos de suicídio entre os jovens. Em 2019, a faixa de 18 a 32 anos tinha o suicídio em decorrência da depressão como a 4ª maior causa de morte. Em 2025, ele ocupará o 1° lugar no ranking. Eu precisava fazer alguma coisa em relação a isso. Todos nós precisamos. Nossa intenção é mostrar como estamos, cada vez mais, fechados para os outros, presos em nossas próprias bolhas, e como isso é prejudicial para nós mesmos e para a sociedade.
2.Como foi ser idealizador e produtor de ‘Sedes’?
Já tenho uma longa relação com o trabalho de Wajdi Mouawad, que é autor dos textos de “Incêndios”, “Céus” e “Sedes”. É uma trilogia muito potente e, por isso, o procurei assim que conheci a primeira obra. Conquistei, com muito suor, muito trabalho, dando satisfação diariamente de cada detalhe de cada montagem, o direito exclusivo de produzir os textos do Mouawad na América Latina, o que é uma honra. Minhas montagens foram exportadas para o Uruguai e Argentina, “Incêndios” e “Céus”, respectivamente.
Ser idealizador de “Sedes” é como ser um realizador de sonhos de um monte de gente, para tentar transformar a vida do espectador depois da peça pronta. É uma responsabilidade imensa porque eu, realmente, imponho as minhas ideias para a equipe que eu convido pra trabalhar. E faço tudo sozinho: desde a compra dos direitos, às pesquisas, trago os especialistas nos assuntos que vamos tratar para dar palestras. Passo horas e horas com a Angela (tradutora) verificando se escolhemos a palavra certa. É muito trabalho. Muito. Trabalho duro mesmo. Tenho muita fé na minha formação cultural, por isso insisto tanto com meus diretores e bato o pé sobre questões artísticas. Mas é gratificante, porque sinto que estamos concluindo a trilogia com chave de ouro. De diamante. Com esse espetáculo, faço a idealização, atuação e direção de produção. São 3 funções completamente diferentes, e eu agradeço muito a cada um da equipe que comprou minhas “loucuras”. Agradeço diariamente.
3. Você e seu personagem têm alguma semelhança? E qual a maior diferença entre ambos?
Eu interpreto o Sylvain Murdoch, que vive várias inquietações e tem muitas críticas à sociedade. A peça é um debate sobre problemas muito atuais e acho que essa pode ser uma semelhança entre o meu personagem e eu. Também sou uma pessoa questionadora e sinto que as situações que incomodam o Murdoch são bem pertinentes. Talvez, a diferença seja a forma que ele escolhe comunicar esses incômodos. O personagem é borderline e, apesar de trazer questionamentos importantes, nem sempre faz isso com equilíbrio. A história é bem poética, mas igualmente trágica. Não quero dar muitos spoilers, o público precisa assistir para entender!
4. O que você leva de aprendizado desse trabalho?
O texto de “Sedes” tem o poder de transformar o público que vai assistir o espetáculo, então, imagina a transformação dos atores que estão dando vida aos personagens! Com toda certeza, esse papel me deu a chance de ter grandes aprendizados. Gosto de dizer que quero sair diferente a cada trabalho que faço, e esse, sem dúvidas, foi um deles. “Sedes” ensina muitas lições sobre a importância de olharmos com mais empatia para o outro e de estarmos mais disponíveis para trocas verdadeiras, diferente da dinâmica rápida e superficial das redes sociais.
5. Quais seus planos após a peça?
Queremos estender a peça para outros teatros cariocas e levar para outros estados! Então, com certeza ainda ficaremos em cartaz por mais tempo, mas já tenho outros projetos em andamento. Um dos próximos trabalhos a ser lançado é o filme “Encanto Quebrado”, que é um filme da Imovision. Logo em seguida, será o lançamento do “Nosso Lar 2”. Nesses dois filmes, estou interpretando os meus primeiros protagonistas no cinema. No Nosso Lar 2, eu sou antagonista e o protagonista é o Edson Celulari. Também tenho alguns compromissos com a França! Fui selecionado para o Théâtre National La Colline, para o desenvolvimento de um projeto com o Wajdi.
6. Quais conselhos pode dar para alguém que quer ser artista?
Como ator, posso dizer que devemos aproveitar qualquer oportunidade de ser testado e de fazer audições. É importante se jogar, independentemente de passar ou não, porque isso pode te render um conhecimento muito importante. Tem coisas muito básicas, mas que é bom relembrar, como olhar no olho e criar laços com as pessoas. Também precisamos aproveitar os momentos em que estamos ao lado de atores ou diretores experientes para observar e aprender com eles. Além disso, também sugeriria que você juntasse algum dinheiro, sempre que possível, para estar preparado caso, no futuro, queira produzir alguma coisa que te faça feliz. Fiz isso desde cedo e acho que, parte do que alcancei, foi porque decidi me produzir. É uma chance de escolher trabalhar com o que te move e com pessoas que você admira.